O que dizem sobre nós
Desejos de pai
“Oh meus amigos, não há dúvidas, aqui não há moeda falsa!”. Foram essas as palavras exactas do nosso médico obstetra assim que viu uma foto do meu filho seguida de uma foto minha com a mesma idade. E de facto, tenho de assumir, é verdade. O raça do miúdo é mesmo parecido comigo. Tem o meu nariz. A minha cor de cabelo. O meu arroto. Mas como será ele daqui a alguns anos? Será que vai ter ainda mais semelhanças? E além das parecenças físicas, será que vai ser como eu noutras coisas? É óbvio que aquilo que queremos é que eles tenham saúde, sejam felizes e, já agora, que nos deixem dormir um bocadinho à noite. Mas, confesso, há algumas coisas minhas que eu gostava que ele herdasse. Exemplos?
Gostava que, tal como eu, ele fosse do Sporting. [É, nesta altura, que quem está a ler isto está a fazer a pergunta óbvia: Mas como pode o miúdo não ser do Sporting? Infelizmente, como a mãe não é sportinguista, tivemos que chegar a um acordo: a criança é que vai escolher as suas cores clubisticas. Mas obviamente que se escolher outra agremiação desportiva que não o Sporting Clube de Portugal, o miúdo vai comer peixe cozido e iscas até atingir a maioridade] Já o estou a imaginar, de mão dada com o pai, a chegar a Alvalade e a fazer montes de perguntas e eu a dar as respostas que ele precisa ouvir. “Oh Pai, onde estamos a ir antes do jogo? – Filho, Vamos comer uma bifana à roulotte!” “Oh Pai, o que quer dizer «gatuno»? – Filho, é gato em italiano..” “Oh Pai, porque atiraram uma lata de tinta à cabeça daquela senhora? – Filho, ninguém atirou nada… é a Maria José Valério.”
Gostava que, tal como eu, ele fosse fã de rock. Quero muito mostrar-lhe música. Mais que mostrar, quero que a música faça parte do meu filho. Quero que ele saiba que houve quatros marmanjos de Liverpool que mudaram a história disto tudo. Que há uma banda irlandesa com uma letra e um algarismo que faz música tão boa que desde os anos 80 que é a favorita do pai. Que numa cidade americana chamada Seattle a dada altura surgiram algumas bandas que fizeram dos melhores discos rock de sempre. Quero mostrar-lhe Radiohead. E Fleetwood Mac. E Supertramp. Os Deep Purple. Mas também quero que ele saiba que não há qualquer problema em saber a letra toda do “Comunhão de Bens” da Ágata e o “Aperta, aperta com ela”, do José Malhoa. [Cujo titulo original é “Baile de Verão”. Nestas coisas da música, desculpem lá, gosto de ser rigoroso.]
E gostava que, tal como eu, ele não tivesse muito jeito para assobiar. É que assim teria a certeza absoluta que nunca o iria apanhar a assobiar o Winds of Change, dos Scorpions.
Vasco Palmeirim